04 dezembro 2013

Frio e Hipotermia (1ª parte)




Uma vez que estamos a ultrapassar uma vaga de frio, achamos conveniente abordar o tema do frio e da hipotermia em montanha, porque sabemos que para os amantes da montanha nem o frio é um factor de desmotivação. No entanto é conveniente ter alguns conhecimentos sobre o assunto antes de iniciarmos uma incursão na montanha nestas condições, motivo pelo qual redigimos este artigo.






Frio

Regulação térmica

A temperatura do corpo humano é normalmente de 37ºC. O corpo humano nu, apenas pode manter esta temperatura constante se a temperatura ambiente estiver acima dos 28ºC.  Abaixo desta temperatura, o corpo fica dependente da roupa e dos refúgios, para assim nos abrigarmos do ambiente e reduzirmos a perda de calor. A hipotermia já poderá representar um risco quando a temperatura ambiente estiver abaixo dos 15,5ºC.





Em repouso, o corpo humano produz entre 40 e 60 kcal de calor por m2 de superfície corporal. O movimento e as tremuras podem aumentar a produção de calor entre 2 e 5 vezes em relação a esses valores.






Mecanismos da perda de calor




O calor pode perder-se através de vários mecanismos:

. Radiação: o calor perde-se por transferência directa para o ambiente. A perda de calor por radiação depende da totalidade de superfície corporal exposta e da diferença de temperatura entre o corpo e o ambiente envolvente. Quanto mais frio for o ambiente e mais superfície corporal estiver exposta, mais calor se perde. Em ambiente seco, a radiação é a causa mais importante de perda de calor (55% - 65% de perda de calor). Cerca de 30% da perda de calor ocorre pela cabeça e pelo pescoço. A roupa faz com que o calor não se perca tão rapidamente. Em caso de emergência pode ser útil envolver o corpo com folhas de papel de jornal (o ideal será entre 14 e 15 folhas).





. Convecção: o ar em contacto com a pele aquece-se até alcançar a temperatura desta. Quando o ar quente se movimenta, chega no seu lugar ar frio que por sua vez, também se deve aquecer. Como o calor necessário para aquecer o ar é proveniente da pele, o corpo vai perdendo calor. As maiores perdas de calor por convecção têm lugar quando o ar está em movimento (vento).





O calor corporal perde-se quando os espaços que aprisionam o ar dentro da roupa são submetidos ao efeito do vento. O ar acumulado nos tecidos e nos espaços existentes entre as diferentes camadas de tecido armazenam o calor produzido pelo corpo. O vento substitui este ar quente por ar frio. O vento é o responsável de aproximadamente 10% da perda de calor. Quando a temperatura do ar é superior à temperatura corporal, o corpo ganha calor. A quantidade de calor subtraída pelo vento aumenta de forma proporcional ao quadrado da velocidade e não em proporção directa a esta. A perda de calor por convecção pode-se reduzir com uma camada exterior que não permita que o vento passe para o seu interior. Os ventos com velocidade superior a 64 km/h apenas produzem um pequeno efeito adicional.
A -30ºC, as partes do corpo expostas ao vento podem congelar num minuto e a -60ºC, em apenas 30 segundos.





Segundo Danielsson, qualquer que seja a velocidade do vento, o risco de congelação é pequeno se a temperatura ambiental for superior a -10ºC, e alto se for inferior a -25ºC.

A velocidade do vento pode ser estimada por uma série de sinais:

. 16 km/h: sente-se o vento na cara.
. 32 km/h: movem-se as ramas pequenas das árvores e levanta-se a neve em pó.
. 48 km/h: movem-se as ramas grandes das árvores.
. 64 km/h: move-se toda a árvore.

. Conducção: o calor corporal perde-se pelo contacto com algo frio, como a água, o metal, etc. A imersão em água fria pode aumentar a perda de calor por conducção cerca de 25 a 32 vezes em comparação com o ar, e o aço ainda o aumenta mais. Geralmente a perda de calor por condutividade corresponde a aproximadamente 2% da perda total de calor, mas com roupa húmida, esta perda pode-se multiplicar por 5. O facto de dormir no solo sem um isolamento adequado, aumenta a perda de calor por condução. As esteiras de espuma oferecem um isolamento maior do que as colchonetes de ar, pois estas permitem a livre circulação do ar.





. Evaporação: é a transformação da água da sua forma líquida para a sua forma gasosa (vapor). Quando a água se evapora, leva o calor com ela. A evaporação é responsável por 30% da perda de calor.
A evaporação da água do corpo pode ocorrer através do ar exalado (que contém água), ou através da pele (transpiração). A transpiração pode ser sensível, quando nos apercebemos dela (sudoração), ou insensível, quando ocorre sem nos apercebamos (perspiração insensível).





- Sudoração: o corpo sua para eliminar o excesso de calor. O calor corporal perde-se pela evaporação da humidade da superfície da pele, por isso mesmo é importante que a roupa não fique húmida de suor. A roupa húmida pode originar perda de calor por evaporação, condução, convecção e radiação. Por este motivo é melhor vestirmo-nos por camadas, deste modo podemos agasalhar-nos e desagasalharmo-nos com maior facilidade, dependendo das necessidades.





- Perspiração insensível: o corpo também transpira para manter um nível de humidade de 70% próximo da pele, num ambiente frio e seco, e isto pode originar uma importante perda de calor.





- Respiração: quando se respira o ar frio e seco, este aquece e humidifica através da humidade que se evapora pelas vias aéreas, o que origina uma perda de calor por evaporação.






Mecanismos de adaptação às mudanças de temperatura

. Vasodilatação: A dilatação dos vasos sanguíneos aumenta a perda de calor quando a temperatura ambiental é inferior à temperatura corporal. A máxima vasodilatação pode aumentar o fluxo sanguíneo cutâneo até 3.000 ml/min. (normalmente está situado entre os 300 e 500 ml/min.).





. Vasoconstrição: o estreitamento dos vasos sanguíneos diminui a perda de calor. A máxima vasoconstrição pode diminuir o fluxo sanguíneo até 30 ml/min.







. Vasodilatação induzida pelo frio: quando as mãos ou os pés arrefecem a 15ºC surge a máxima vasoconstrição e, portanto, o fluxo sanguíneo que chega a estas extremidades é reduzido ao mínimo, arrefecendo-as. Se continuar a arrefecer até aos 10ºC, a vasoconstrição interrompe-se intercalada por períodos de 5 a 10 minutos de vasodilatação, o que aumenta o fluxo sanguíneo e assim, o calor que chega às extremidades. A exposição repetida à água fria (por exemplo umas quinze vezes), pode aumentar esta resposta e oferecer um certo grau de aclimatação.





. Sudoração: a evaporação do suor arrefece o corpo.

. Tremuras: geram calor através do aumento das reacções químicas requeridas pela actividade muscular. As tremuras podem aumentar a produção de calor em cerca de 500%. Este mecanismo está limitado a poucas horas devido ao esgotamento da glucose muscular consumida ao produzir a contracção do músculo que treme, com o consequente aparecimento de fadiga.

. Aumento ou diminuição da actividade física: pode aumentar ou diminuir a temperatura.





. Respostas comportamentais: o nosso cérebro estimula-nos a colocar ou retirar roupa.




Contamos ter enriquecido algum conhecimento sobre o tema abordado, de forma que vão para a montanha devidamente preparados para o pior. No próximo artigo completaremos este tema abordando a hipotermia. Até lá...





Boas caminhadas

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